A pandemia do novo coronavírus é uma crise sanitária na qual líderes nacionalistas conseguiram transformar o vírus em um argumento a mais para mobilizar suas bases político-ideológicas.
Pelo menos desde março, quando a OMS (Organização Mundial da Saúde) decretou oficialmente a existência de uma pandemia, países divergiram sobre fechamento de fronteiras, disputaram compras de insumos vitais e, no fim, entraram numa corrida por acesso aos imunizantes.
A cooperação internacional oscilou. A União Europeia, por exemplo, viveu primeiro um momento de fechamento de suas fronteiras internas, para só depois pôr em funcionamento mecanismos robustos de cooperação econômica.
Fora da Europa, países ricos e influentes, como China e EUA, inseriram a distribuição de insumos em suas estratégias mais amplas de busca de influência política e econômica por meio da diplomacia sanitária, ao distribuir, por exemplo, máscaras e respiradores mecânicos a países mais pobres.
No caso dos EUA, esse protagonismo positivo foi ofuscado pelo envolvimento em episódios de desvios de mercadorias e “pirataria moderna”. Os americanos se engajaram num verdadeiro leilão de insumos, no qual encomendas vitais que passaram por seu território chegaram a ser canceladas ou desviadas de seus destinos originais, permanecendo nos EUA.
Em pleno ano eleitoral, o presidente Donald Trump fez dos ataques à China uma arma de campanha e de mobilização de sua base nacionalista. O republicano passou a referir-se ao “vírus chinês” como forma de antagonizar com seu maior adversário comercial.
A postura de Trump ecoou no Brasil, onde o presidente Jair Bolsonaro também criticou a vacina produzida por laboratórios chineses em parceria com o Instituto Butantan, de São Paulo.
Na Rússia, o presidente Vladimir Putin anunciou a Sputnik-V como o primeiro imunizante eficaz do mundo contra a covid-19, mesmo antes de concluídos os testes. O nome da substância, copiado do primeiro satélite artificial a ser posto em órbita pelos soviéticos, em 1957, foi uma clara referência ao clima de corrida científica e Guerra Fria com os EUA e as demais potências ocidentais.
Abaixo, o Nexo lista cinco conteúdos publicados em 2020 que ajudam a revisitar e entender o assunto.
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Deisy Ventura, especialista em saúde global, fala sobre a interseção entre doença e poder nas relações internacionais e os desafios que a epidemia apresenta para o governo chinês
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Com recorde de mortos, um sistema de saúde colapsado e taxas históricas de desemprego, EUA veem se tornar mais frágil uma imagem construída a partir da Segunda Guerra Mundial
A acusação contra os EUA de prática de ‘pirataria moderna’
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