De grupos que ignoram evidências para se opor a vacinas à crença infundada de que a Terra seria plana, movimentos que negam a ciência ganharam espaço no debate público ao longo da década de 2010. A chegada da pandemia explicitou como esse discurso pode ser instrumentalizado por políticos.
Com uma crise sanitária sem precedentes pressionando a economia, alguns líderes mundiais — no geral eleitos na ascensão de uma extrema direita conhecida por atacar o conhecimento científico e universidades — adotaram como estratégia negar a gravidade do novo coronavírus.
Nos Estados Unidos, o presidente Donald Trump chegou a dizer que a crise “simplesmente desapareceria” em algum momento. No Brasil, a gestão do presidente Jair Bolsonaro, admirador de Trump, foi ditada pelo negacionismo e pelo anticientificismo: ele se referiu à covid como “gripezinha” e chamou a preocupação com o vírus de “histeria”. Os dois países terminam 2020 com os dois maiores números de mortes pela doença no mundo.
O governo federal brasileiro atuou para sabotar medidas de distanciamento e isolamento social adotadas por estados e municípios, consideradas a melhor maneira de barrar a doença na ausência de remédios e vacinas. Dois médicos que comandavam o Ministério da Saúde foram substituídos, e a pasta passou a ter a sua frente um general que admitiu em entrevista não saber o que era o SUS (Sistema Único de Saúde).
Atenção tardia para um serviço público que se mostrou essencial na pandemia e é cada vez mais valorizado pela população – a confiança dos brasileiros no SUS teve crescimento recorde em 2020, enquanto caiu a depositada no presidente da República.
Até dezembro, Bolsonaro ainda tinha como principal bandeira a aposta na hidroxicloroquina, um remédio para malária que estudos mostraram não ter efeitos contra o coronavírus. Também dava declarações desincentivando a vacinação, num contexto em que grupos antivacina aumentam sua atuação e mais brasileiros declaram não ter intenção de se imunizar contra a covid-19.
Abaixo, o Nexo lista cinco conteúdos publicados em 2020 que ajudam a revisitar e entender o assunto.
O cálculo de uma tragédia: sem ciência na gestão
O Brasil atingiu a marca de 100 mil mortos pelo novo coronavírus em 8 de agosto de 2020. Publicada semanalmente, esta série do ‘Nexo’ em cinco capítulos aborda os aspectos sanitários, econômicos, políticos e sociais de um tempo que mistura cálculo e incerteza.
Sem remédios básicos para UTI, com cloroquina de sobra
Órgãos de controle apontam baixa execução orçamentária e decisões desencontradas de um Ministério da Saúde que está sem titular.
A responsabilização de Bolsonaro na pandemia sob análise
Ao ‘Nexo’, professores de direito e ciência política falam sobre as possíveis consequências eleitorais e jurídicas das ações e omissões do presidente da República durante a crise sanitária.
Como a cloroquina mostra o que há de ciência na prática médica
Debate sobre uso de medicamento sem eficácia contra a covid-19 opõe entidades que representam profissionais. Faculdades cogitam fortalecer ensino sobre evidências científicas.
O que é o ceticismo científico. E por que ele é necessário
Carl Sagan cunhou termo nos anos 1980 para defender uma atitude crítica. É algo muito diferente do negacionismo, que cresce na pandemia do novo coronavírus.