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Como se proteger do calor que toma conta do Brasil

Termômetros batem recordes em diferentes partes do país. Quatro capitais devem registrar 40°C na semana. O ‘Nexo’ ouve médicos sobre recomendações para aliviar desconfortos e riscos à saúde

    A segunda-feira (13) foi de novos registros de temperaturas altas pelo Brasil. O país passa por uma forte onda de calor, que atinge as diferentes regiões do país, levando a recordes nos termômetros.

    O fenômeno extremo traz riscos para a saúde humana, principalmente pelo chamado "estresse por calor".

    Neste texto, o Nexo ouve médicos sobre o que fazer para se proteger no contexto de uma onda de calor como a que atinge o Brasil em novembro de 2023.

    A onda de calor

    Parte do país enfrenta uma onda de calor que deve durar pelo menos até o próximo domingo (19), segundo meteorologistas. O fenômeno atinge principalmente as regiões Centro-Oeste e Sudeste do Brasil, mas não só: chegam também ao Norte, ao Nordeste e ao Sul do país.

    Até terça-feira (14), cerca de 1.400 municípios devem ser atingidos. Quatro capitais devem bater a marca de 40°C ao longo da semana, de acordo com o Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia): Boa Vista, Campo Grande, Cuiabá e Teresina.

    No Sul e no Sudeste, o final de semana foi de recordes em algumas capitais. No domingo (12), Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Vitória bateram máximas de temperaturas registradas. Na capital fluminense, a sensação térmica ultrapassou os 50°C tanto no domingo como na segunda-feira (13).

    Na tarde de segunda-feira (13), o Inmet listava 16 estados como em situação de “grande perigo” devido à onda de calor. Segundo o instituto, isso significa que estão previstos “fenômenos meteorológicos de intensidade excepcional”, com riscos relevantes à saúde humana. O alerta vai até sexta-feira (27) e atinge as seguinte unidades:

    1. Amazonas
    2. Bahia
    3. Distrito Federal
    4. Espírito Santo
    5. Goiás
    6. Maranhão
    7. Mato Grosso
    8. Mato Grosso do Sul
    9. Minas Gerais
    10. Pará
    11. Paraná
    12. Piauí
    13. Rio de Janeiro
    14. Rondônia
    15. São Paulo
    16. Tocantins

    O Inmet também registrou situação de grande perigo por baixa umidade em quatro estados, todos no Nordeste: Bahia, Ceará, Piauí e Pernambuco.

    Como se proteger

    As temperaturas extremas podem levar o corpo humano a uma situação chamada por médicos de “estresse por calor”. É o que acontece quando o organismo, por causa do calor externo, passa a ter dificuldades de controlar sua própria temperatura.

    O estresse por calor pode se manifestar de diferentes maneiras (que serão abordadas abaixo). No limite, a situação pode evoluir para uma insolação — quando a temperatura do corpo ultrapassa os 40° C e o organismo não consegue mais se resfriar. Essa condição, por sua vez, pode ser fatal.

    O Nexo conversou com médicos para entender as diferentes formas pelas quais as pessoas podem se proteger dos riscos na onda de calor extremo. Os médicos ouvidos foram:

    • Mayara Floss, médica de família e comunidade e pesquisadora do IEA-USP (Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo)
    • Rogerio Luz Coelho Neto, médico de família e comunidade e mestre em desempenho esportivo pela UFPR (Universidade Federal do Paraná)

    Veja abaixo as principais dicas para lidar com o calor extremo. Outras recomendações podem ser encontradas em informes do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde.

    Foco na hidratação

    Os médicos ouvidos pelo Nexo disseram que uma das áreas de maior atenção em uma onda de calor deve ser a hidratação.

    Ao se hidratar, o ideal é dar preferência à água ou a líquidos claros, como sucos naturais e chás. Essas bebidas podem estar tanto geladas quanto em temperatura ambiente.

    Refrigerantes, energéticos, bebidas com cafeína e bebidas alcoólicas devem ser evitados. Segundo Floss, esses líquidos “podem aprofundar os sintomas e ajudam a piorar a reação às ondas de calor”.

    A quantidade de líquido que deve ser ingerida varia de acordo com a pessoa. Crianças e idosos precisam receber atenção especial para garantir que estão se hidratando.

    Pessoas com doenças crônicas, atletas e pessoas que trabalham em maior exposição ao sol — como trabalhadores da construção civil, entregadores que andam de bicicleta, trabalhadores rurais e jardineiros — também precisam aumentar a quantidade de água ingerida. As pessoas em situação de rua são as mais vulneráveis ao calor extremo e precisam ter acesso a locais de hidratação.

    Segundo Coelho Neto, um bom jeito de uma pessoa saber se está bebendo líquido o suficiente é pela cor da urina: o ideal é que ela tenha uma cor mais clara. “Quanto mais concentrada a urina, mais isso quer dizer que você tomou menos água do que precisaria”, disse o médico.

    Coelho Neto também sugeriu um cálculo para indicar quanto líquido cada pessoa deve ingerir: 35 ml a cada kg de peso corporal. Para uma pessoa de 60 kg, isso significa 2,1 litros de água; para uma pessoa de 80 kg, 2,8 litros, e por aí vai. As pessoas que se enquadram nas situações agravantes citadas acima, no entanto, devem tomar ainda mais água.

    Adaptação da dieta

    De forma geral, Floss e Coelho Neto recomendaram a adoção de uma dieta mais leve em uma situação de calor extremo.

    Por um lado, isso significa evitar pratos mais gordurosos, como carnes vermelhas e porções de petiscos. Por outro, significa dar preferência a alimentos frescos, sobretudo frutas e verduras. “Sempre preferir descascar mais e desembalar menos, dentro da possibilidade de cada um”, disse Floss.

    A pesquisadora da USP também recomendou a ingestão de várias porções durante o dia, em vez de poucas refeições.

    Durante uma onda de calor, também é preferível evitar ou reduzir o hábito de fumar. “Se você conseguir diminuir a nicotina, vai diminuir o risco de que o calor possa te afetar de maneira mais negativa”, disse Coelho Neto.

    Rotina de exercícios

    Os médicos ouvidos pelo Nexo recomendaram evitar atividades físicas nos horários mais quentes do dia, sobretudo se forem feitas em espaços abertos com alta exposição ao sol.

    Os horários a serem evitados são aqueles entre 10 da manhã e 4 da tarde. Ou seja, a preferência deve ser dada às primeiras horas da manhã ou ao fim da tarde e começo da noite.

    Coelho Neto também disse que não é indicado aumentar a carga de exercícios em um momento de calor extremo. O médico também recomendou atenção aos sinais do corpo: “Se você estiver se sentindo mal pelo calor, talvez esse seja o dia de pular a academia”, afirmou, recomendando, nesses casos, a hidratação e a alimentação com frutas e verduras.

    Floss também disse que profissionais do esporte precisam estar atentos para eventualmente cancelar sessões de atividades físicas ou competições. “Quem trabalha com isso — como instrutores e treinadores — deve orientar os atletas para tomarem os devidos cuidados”, disse a médica, citando a necessidade de ingerir muito líquido.

    Formas de se refrescar

    Floss e Coelho Neto disseram que, dentro do possível, é recomendável evitar a exposição ao sol em dias muito quentes. Sugeriram a tentativa de ficar em ambientes mais frescos, para evitar que o corpo fique sujeito a aumentos descontrolados de temperatura.

    Nesse sentido, ventiladores e aparelhos de ar-condicionado são opções possíveis. Ainda assim, inspiram cuidados. “Ar-condicionado ajuda muito na sensação térmica, mas ele muitas vezes é um desumidificador do ar”, disse Coelho Neto. “Quem tem propensão a rinites e irritação no olho, no nariz e na garganta precisa tomar um pouco de cuidado”, afirmou.

    Para quem não tem acesso a esses aparelhos, a ventilação com janelas também é uma forma de manter os ambientes mais frescos. “As orientações são de deixar as janelas abertas durante a noite e no começo da manhã e fechá-las entre o fim da manhã e a tarde, principalmente em lugares que pegam muito sol”, disse Floss.

    No limite, se o ambiente da casa estiver muito quente e não ficar mais fresco com janelas abertas, é recomendável a ida a um local com ar-condicionado, como shoppings ou outros prédios de acesso público.

    Os médicos também disseram que banhos com temperaturas mais baixas e toalhas úmidas são boas opções para ajudar a refrescar.

    Sintomas para ficar atento

    Diferentes sintomas podem indicar estresse por calor ou até insolação. Entre eles estão:

    • Cãibras durante exercícios físicos
    • Cansaço sem motivo aparente
    • Falta de urina
    • Rubor da pele
    • Volume baixo de suor

    Outro sintoma possível é a tontura ou cabeça leve. Nesses casos, o recomendado é encontrar um ambiente mais fresco, sentar e se hidratar.

    A confusão pode ser também um sinal de gravidade da situação, sendo recomendado procurar ajuda de profissionais da saúde.

    Por fim, em casos de desmaio, é necessário chamar ajuda profissional de forma emergente. No limite, pode ser preciso prestar primeiros socorros.

    As mudanças climáticas

    Um dos responsáveis pelo calor em 2023 é o fenômeno meteorológico El Niño. Ele teve início em junho e poderá se alongar até abril de 2024, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas).

    O El Niño é marcado pelo aquecimento das águas do Oceano Pacífico equatorial. No Brasil, via de regra, significa mais seca na região Norte e mais chuvas no Sul — além de temperaturas mais altas no Sudeste e no Centro-Oeste. Entenda o funcionamento do fenômeno no vídeo do Nexo abaixo.

    Outra responsável pelas temperaturas altas é a mudança climática, causada pela emissão de gases do efeito estufa. Por causa dela, eventos extremos — como secas, temporais fortes e ondas de calor — tendem a ficar cada vez mais frequentes. Apesar de ser um fenômeno natural, o próprio El Niño está sendo intensificado pelas mudanças climáticas, segundo cientistas.

    Frente à tendência de aumento da frequência de ondas de calor, Floss, da USP, disse que não basta olhar para as ações individuais. “Temos que ter cuidados individuais, mas é importante ter o olhar para a necessidade de políticas públicas, para estarmos preparados para a questão das mudanças climáticas”, disse a pesquisadora. Um exemplo dado foi o de um ônibus lotado e sem ar condicionado, que pode piorar a situação de pessoas em caso de temperaturas altas.

    O calor intenso não é uma exclusividade do Brasil em 2023. Em julho, uma forte onda de calor atingiu países na Europa, na América do Norte e na Ásia.

    Julho e setembro de 2023 já foram apontados por diferentes organizações de estudo climático como os meses mais quentes da história. O Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus, da União Europeia, afirmou em 8 de novembro que 2023 provavelmente será o ano mais quente do planeta em 125 mil anos.

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