“Minha mãe estava grávida de mim enquanto esteve presa”, Tupac explicaria anos depois. “Ela foi a própria advogada. Nunca fez faculdade de direito. A pena seria de uns trezentos anos. Uma mulher negra, grávida, venceu o caso. Isso mostra a força de uma mulher negra e a força dos oprimidos.”
Apenas horas depois, os jurados, os advogados de defesa, Afeni, Jean e muitos dos outros acusados se encontraram no escritório de advocacia de Lefcourt e Crain para um encerramento em comemoração. Eles beberam champanhe e relembraram os últimos meses. Todos sorriam. Benjamin Giles, o jurado número nove, estava lá. Ele perguntou a Afeni onde ela aprendera a se portar daquela forma.
— Medo, Sr. Giles, medo puro — respondeu ela.
Trinta e quatro dias depois, em 16 de junho, Afeni estava sentada no sofá da irmã folheando as páginas do New York Times. Estava ressentida da propaganda anti-Panteras que cobria as páginas e esperava ver seu nome pelas matérias. Jean lavou a louça da tarde, espiou pela janela da cozinha e observou distraidamente uma família de ratos correndo pelo estacionamento abandonado. As duas estavam perdidas em pensamentos, absorvidas pela tranquilidade entre elas.
A primeira contração passou por Afeni como um trovão suave. Jean olhou para ela do outro lado da sala e a viu pegar o telefone. Alguns minutos depois, seu novo amigo, Frankie Zipp, estacionou seu novíssimo Cadillac conversível branco 1971 na calçada em frente ao apartamento e logo ajudou Afeni a entrar no carro. De um banco traseiro estofado em couro vermelho, Afeni e Jean olhavam para o volante e para as mãos inchadas e quase deformadas de Frankie, para sempre danificadas por conta de seus devastadores dias de vício em heroína. Seguiram em silêncio, esperando avistar o hospital.
Horas depois de Afeni chegar ao New York Flower-Fifth Avenue Hospital, nascia Tupac Amaru Shakur. Mas a paranoia instalada em Afeni pelos Panteras e pelo tempo na prisão havia apenas crescido desde o julgamento. Para impedir que o governo marcasse o filho como um bebê dos Panteras e, portanto, o indicasse como uma “ameaça à sociedade”, ela decidiu registrá-lo como Parish Lesane Crooks, em homenagem a Carol Jean Crooks, também conhecida como “Crooksie”, ex-companheira de cela de Afeni que se tornara uma amiga querida.
“Lesane” era o sobrenome de Jean. “Escolhi um nome qualquer. Escolhi uma combinação de vários nomes”, conta Afeni. “Deixei uma mulher lésbica (Crooksie), que era minha amiga, dar a ele o nome de Parish. Lesane era o nome da família da minha irmã na época. E também Crooks, por causa da equipe de break dance Crooks Crew. É isso. Era isso o que estava no papel. Mas Tupac sempre foi o nome dele. Tupac Amaru Shakur. Ele sempre foi na minha mente um soldado no exílio, desde o começo. Era assim que eu o via.”
Tupac significa “real” ou “brilhante”, e Amaru significa “serpente”. O nome pertencia originalmente a uma linhagem de honrosos líderes inca peruanos. Era desejo de Afeni que Tupac incorporasse o espírito da África, mas também o espírito de todo o povo indígena do mundo. “O que eu queria era dar ao meu filho um nome não em homenagem a um africano, mas em homenagem a uma pessoa indígena que não fosse africana”, ela explicou mais tarde. “Porque eu precisava que ele soubesse que tínhamos a mesma identidade de toda pessoa indígena no mundo. Fazíamos parte de uma geração que acreditava que os nomes eram a base para uma criança. Por isso eu queria que ele estivesse sobre uma fundação [ampla]. Em vez de ter um apego desmedido à cor da pele, eu queria que ele encontrasse um significado mais profundo no motivo da nossa luta. Não apenas porque somos negros, mas porque, como as outras pessoas indígenas no mundo, temos uma luta em comum. Eu queria que ele entendesse esse sentimento. E é por isso que seu nome, Tupac Amaru, é lindo de ouvir.”
Quando o médico envolveu o bebê Tupac em um cobertor e o levou para fora da sala de parto, Afeni ficou tensa. Embora o médico garantisse que seu filho estaria seguro, Afeni temia que alguém trocasse, machucasse ou roubasse intencionalmente seu bebê. Ela pediu a Jean que ficasse por perto, para confirmar a identificação do bebê antes que fosse levado para o berçário. Jean esperou ansiosamente no corredor, e enfim foi recebida pelo médico e seu sobrinho recém-nascido. O médico segurou o bebê na frente de Jean, do jeito que havia prometido. Ela sorriu para o corpo minúsculo do sobrinho enrolado em um cobertor. “Ok, meu querido, aí está você, eu te conheço agora, nada vai acontecer com você, porque a tia Jean tá aqui pra garantir isso.” Estas foram suas primeiras palavras para Tupac. Ela cumpriria aquela promessa muitas vezes nos anos que se seguiram.
Tupac Shakur: A biografia autorizada
Staci Robinson
Trad. Karine Ribeiro
Editora BestSeller
432 páginas
Lançamento em 20 de novembro