Foto: Nacho Doce/Reuters - 5.nov.2015

A produção agrícola orgânica e o estímulo à conexão de redes 


Toda iniciativa de fortalecer as redes de agricultores é bem-vinda. É fundamental construir laços entre as instituições que possibilitem que mais pessoas se capacitem e tenham oportunidades de buscar informações

O Brasil tem uma situação bastante desafiadora em relação a sua agricultura. Segundo dados do Censo Agrícola de 2017/2018, nosso país possui aproximadamente 5 milhões de unidades agrícolas, das quais 4 milhões são de agricultores familiares. Esses produtores muitas vezes trabalham de forma desarticulada, sem a possibilidade de avaliar o que está sendo feito em outros territórios, e o que de fato pode ser desenvolvido. Com redes desconectadas, não existe acesso a quem já passou por uma curva de aprendizado e implementação de algum tipo de iniciativa nesse sentido. Soma-se a isso uma demanda crescente por uma produção sustentável de alimentos e que possam ser entregues em condições adequadas, o que exige uma integração de atores e profissionalização de práticas.

Por isso, toda iniciativa de fortalecer as redes de agricultores é bem-vinda. É fundamental construir laços entre as instituições que possibilitem que mais pessoas se capacitem e tenham oportunidades de buscar informações em quem já superou uma condição adversa. Inclusive tais experiências exitosas, podem ser compartilhadas em outros continentes, com contextos similares, por meio de plataformas como o Centro de Excelência contra a Fome do World Food Programme, que divulga e gera cooperação em boas práticas, sendo um espaço de diálogo para ampliar o alcance aos agricultores e estimular a conexão de suas produções.

Projetos que buscam fortalecer estas conexões são de fundamental importância, um exemplo é o projeto “Desenvolvimento das habilidades empreendedoras de microprodutores orgânicos de baixa renda”, realizado pela ONG Aventura de Construir, em parceria com o Carrefour. Seu objetivo é fortalecer o empreendedorismo rural e melhorar o trabalho da agricultura familiar, através de assessorias e capacitações com produtores de alimentos orgânicos.

Outra iniciativa que busca compartilhar experiências é desenvolvida pelo World Food Programme, em parceria com a Agência Brasileira de Cooperação e financiado pelo Instituto Brasileiro do Algodão, no projeto “Além do Algodão”, que mapeou por todo país quem trabalha na produção sustentável e que já possui experiências desenvolvidas na produção de algodão em sistemas diversificados com alimentos, nas mais distintas escalas. Por isso, naturalmente, as iniciativas desenvolvidas pela ONG e pelo Projeto Além do Algodão se juntaram, para partilhar informações e construir materiais para as capacitações, além da sugestão de boas práticas para a formação dos produtores atendidos.

Ao longo do projeto da Aventura de Construir — que inclusive gerou um documentário, chamado “Da Terra Nascem Protagonistas“, financiado pela Lei de Incentivo à Cultura — é possível notar a pluralidade dos agricultores, com diferentes realidades e produções de diversos tamanhos. Há espaço para todo mundo, afinal, existe uma frase que diz: “a crise na indústria de alimentos dura o intervalo entre uma refeição e outra”. Mas este espaço é qualificado, seja para grandes ou pequenos produtores.

A produção agrícola deve ser tratada com todo o planejamento e controle necessário. Se você errar neste ano, apenas na próxima safra, no ano seguinte, poderá corrigir o erro. E um ano é muito tempo

O grande ponto para os produtores menores é profissionalizar o seu negócio, no sentido de identificar o modo de produzir, planejar os seus canais de escoamento e a melhor forma de conservação dos produtos para chegar a mercados estratégicos. Para isso, é importante entender o contexto em que você está inserido, em relação ao seu território, às suas condições de trabalho e de mão de obra disponível, e tecnologias necessárias para produzir de forma eficaz.

Para se desenvolver em qualquer atividade econômica, antes de tudo, é preciso sobreviver dela, seja por meio do consumo direto dos produtos (minimizando custos) ou pela venda dos mesmos (gerando receita para a compra de produtos e serviços). Assim, a produção agrícola deve ser tratada com todo o planejamento e controle necessário. Se você errar neste ano, apenas na próxima safra, no ano seguinte, poderá corrigir aquele erro. E um ano é muito tempo.

Por este motivo, empreender no rural passa por um processo de formação e educação dos agricultores. É necessário construir oportunidades de aprendizado, e a melhor forma de fazer isso é com o compartilhamento de experiências de quem já passou por este processo.

Muito se fala em agregar valor, construir opções de mercado e buscar uma certificação. Mas, antes de tudo, estamos falando de construir naqueles produtores, os atores de fato do negócio, uma visão empreendedora, para que possam de fato saber como gerir sua atividade. Pensar o seu negócio como o seu meio de vida.

Joélcio Carvalho é oficial de projetos no Centro de Excelência contra a Fome Brasil do World Food Programme.

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