Como o gênero é tratado nas Políticas Externas Feministas

Nos últimos anos, diversos países passaram a adotar o que se convencionou chamar de PEF (Política Externa Feminista). As PEF envolvem a implementação de posicionamento e políticas externas voltadas para a diminuição das desigualdades de gênero em todo o mundo.

Esta pesquisa avaliou a eficácia dessas políticas e apresentou formas de implementar um tratamento inclusivo com relação ao tema de gênero aplicado às relações internacionais.

Qual pergunta a pesquisa responde?

Como reconceitualizar o tratamento de gênero nas Políticas Externas Feministas para incluir e humanizar as beneficiárias desses modelos?

Por que isso é relevante?

A pesquisa apresenta um tratamento inclusivo com relação ao tema de gênero aplicado a políticas exteriores com base em proposições de autoras como Achilleos-Sarll (2018). Após revisão de literatura sobre o tema, verificou-se uma emergente crítica dessas políticas que, embora busquem tratar a temática de igualdade de gênero em suas agendas, grande parte desses modelos essencializam informações, ao expor exemplos de parcerias realizadas com países do Sul global.

Resumo da pesquisa

Em 2014, após o governo da Suécia anunciar que implementou um modelo de Política Externa Feminista, Canadá, França, México e Espanha decidiram seguir o mesmo movimento. Embora exista uma literatura emergente em desenvolvimento sobre esse assunto, ainda existem poucos trabalhos sistemáticos sobre os cinco modelos vigentes, bem como sobre a forma de como o tratamento de gênero é construído nessas agendas.

A pesquisa visa apresentar formas de reconceitualização da categoria de gênero nos modelos de PEF, propondo uma abordagem inclusiva e humanizada para tratar as pessoas beneficiárias desse tipo de política. Foram analisados 35 documentos políticos dos cinco países que implementaram os modelos de PEF até março de 2022 utilizando a metodologia de análise de discurso.

O estudo apresenta sugestões de melhorias destes modelos, partindo de propostas de autodeterminação das sujeitas beneficiárias destas políticas, de acordo com a sua orientação sexual, identidade e expressão de gênero, procurando afastar-se do tratamento binário e neocolonial dos discursos de ajuda internacional, ainda presentes em alguns dos contextos identificados.

Quais foram as conclusões?

As principais conclusões da pesquisa foram expor, através de um estudo comparado, as principais características, bem como abordagens dos modelos de Política Externa Feminista adotados em Suécia, Canadá, França, México e Espanha. A partir dessa análise, foram identificados cinco perfis distintos de lideranças dos Estados nos modelos vigentes: o pioneiro, o técnico, o centro-diplomático, o parceiro e o transversal. Além disso, a forma como o gênero é instrumentalizado pelas PEF e como esses tratamentos contribuem para a construção de identidades desses países são discutidos e problematizados.

A pesquisa reforça que a maioria dos cinco Estados não compreende a distinção entre identidade de gênero e orientação sexual e utiliza um tratamento binário para tratar de demandas complexas que o tema de igualdade de gênero demanda. O estudo permite avançar nas discussões de gênero nos modelos de PEF a partir de uma posição decolonial e pós-estruturalista de pesquisa.

Quem deveria conhecer seus resultados?

Think-tanks, pesquisadores e profissionais formadores de decisões políticas vinculadas ao Instituto Rio Branco e/ou ministérios que dialoguem com o tema.

Gabriela Rabello é estudante de PhD pela Université du Québec à Montréal (Canadá). Mestre pela mesma instituição, pesquisa temas sobre políticas externas, regionalismos, estudos feministas e queer aplicados ao contexto de relações internacionais. Tem experiência no trabalho com organizações da sociedade civil no tema de violência contra mulheres em Ottawa (Action ontarienne contre la violence faite aux femmes) e Montréal (Centre d'aide à la Famille). É estudante associada pela ICA (International Communication Association), CCA (Canadian Communication Association) e ABRI (Associação Brasileira de Relações Internacionais). Faz parte dos grupos de pesquisa no IREF/UQAM (Institut de recherches et d'études féministes), na RedLAco (Red Latinoamericana de investigación en comunicación organizacional) e do grupo de trabalho sobre Democracia, Direitos Humanos e Justiça Internacional do Módulo Jean Monnet FECAP (Fundação Escola de Comércio Àlvares Penteado).

Referências

  • Achilleos-Sarll, C. (2018). Reconceptualising Foreign Policy as Gendered, Sexualised and Racialised: Towards a Postcolonial Feminist Foreign Policy (Analysis). Journal of International Women's Studies, 19(1), 17.

  • Aylward, E. et Brown, S. (2020). Sexual orientation and gender identity in Canada's feminist international assistance. International Journal, 75(3), 313-328.

  • Lugones, M. (2007). Heterosexualism and the Colonial/Modern Gender System. Hypatia, 22(1), 186-219. https://doi.org/10.1111/j.1527-2001.2007.tb01156.x

  • Morin, J.F. (2013). La politique étrangère: théories, méthodes et références. Armand Colin.

  • Nascimento, L. (2021). Transfeminismo (1re éd.). Editora Jandaíra.

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